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quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Casamento e o Chamado da Vida

Como já disse em um texto para todo sempre perdido em algum lugar deste blog, fiz engenharia elétrica por uma causa nobre: dinheiro. Mas o curso se transformou num pesadelo para mim, sendo responsável pelos piores 5 anos de minha vida. Sentia-me no passado, lidando com aquelas coisas que me lembravam Matusalem, grandes motores, transformadores e geradores elétricos. Entrar na sala de aula ou laboratório era como entrar numa máquina do tempo de H.G. Wells e ser tele-transportado lá pelos idos de 1831 quando Faraday inventou o gerador elétrico. Nada muito atraente, nenhum sex appeal, no máximo, algumas teias de aranha, muito mofo e histórias do mundo antigo. Às vezes, alguma explosão, um curto-circuito que espalhava fagulhas em todas direções, acordando boa parte dos alunos.

Aqueles anos foram muito sombrios e relendo um memorial da época, fiquei surpreso ao perceber o quanto fazer alguma coisa que não gostamos pode nos  entristecer. Não se trata deste mal do século que muitas pessoas parecem ter hoje e dia, que é a tal depressão, responsável pelos fabulosos lucros da indústria farmacêutica com os remédio tarja-preta, o que me faz crer que, se a depressão não existisse, ela seria criada, sem nenhuma dúvida, pela indústria, pelos psiquiatras, psicólogos e escritores de auto-ajuda.

Acho que nunca tive uma depressão, mas sei da devastação que ela provoca nas pessoas e seguramente, contribui para o aparecimento de doenças, algumas graves, provavelmente o tiro de misericórdia, como que atendendo algum chamado subliminar das pessoas que se enveredam ou se entregam por este caminho sem esperanças, numa brutal indiferença. 

Naquela época eu sentia o sofrimento de estar descontente comigo mesmo e com aquele rumo que havia escolhido para minha vida e isso se traduzia numa quase constante melancolia que me acompanhava, às vezes, mesmo na presença de uma namorada ou outra. Eu estava ali fisicamente, era gentil e carinhoso, mas na verdade estava em outro lugar há muitas milhas dali. Far from home. Mas, talvez esta ausência seja apenas uma característica adquirida em algum momento da minha existência ou mesmo transmitida através de uma falha em um determinado gene no meu DNA. Nunca saberei.

Claro, havia momentos muito felizes, mas hoje quando olho para trás percebo que eles sempre aconteceram nas férias ou em alguma greve geral da Universidade,  afinal, apesar das duas férias anuais, estudantes e funcionários da universidade sempre queriam um descanso extra e as greves, às vezes duravam 2 ou 3 meses. O que me faz crer, que a maior expectativa de vida no Brasil se encontra entre os funcionários das universidades, que possuem uma vida sem o stress convencional dos demais trabalhadores. Mas, isto é uma defeito do sistema e não das pessoas e é provável que se eu estivesse na universidade, e olha que até tentei, também estaria lutando por meu direito de greve. A vida é assim. Somos como camaleões, mimetizados a semelhança do meio ao qual pertencemos.

Tenho registros de 1982 a 1985, o ano em que me casei e parei com o memorial, o que hoje lamento. Mas verdade seja dita, toda a melancolia que se podia perceber naqueles registros, desapareceu como num passe de mágica com o casamento e foi substituída por outros sentimentos diversos pois num casamento há momentos difíceis, mas nunca há o abandono, não há como você se sentir desamparado. Você sempre sabe que pode contar com alguém nos momentos mais difíceis.

Engraçado isto, tudo parece ser simples quando não se casa, porque você é o único dono de seus desígnios, mas acontece algo inesperado: se você está só, isto tem uma importância apenas relativa e na verdade você não é dono de coisa alguma. O destino, vai lentamente assumindo as rédeas e vai te conduzindo, numa brutal indiferença, pois como John Donne disse, “nenhum homem é uma ilha isolada”. Acredito que a solidão acaba por minar aos poucos a segurança que nos possibilita as decisões mais difíceis, mais arriscadas e assim, um a um, vão caindo os pilares que nos sustentam e nossos sonhos vão se definhando e se extinguindo, um a um. E a vida termina quando se acaba o último sonho. Pode-se até sobreviver mas é como se estivesse numa UTI da vida e com ajuda de aparelhos, os tais tarjas pretas ou outras coisas menos lícitas.

Quando menino eu li e reli um livro de Jack London chamado Call of the Wild (Chamado da Selva ou Chamado Selvagem), no qual um grande cão doméstico é levado numa viagem ao Alasca e ali entra em contato com os lobos o que vai despertando nele seus antigos instintos e ele lentamente vai retornando à vida selvagem.

Acho que assim acontece com o casamento, há um chamado maior da vida e aos poucos vamos sendo aliciados e nos entregamos a ele. É chegado nosso momento de criarmos uma família, filhos e fazermos nossa parte para perpetuação da espécie humana. Acho até que uma vida humana pode ser plena mas certamente não será completa sem esta fase.

E com os filhos vem uma miríade de novas sensações e temores. Passamos a ter medo de tudo, pois alguma coisa nos mostra a fragilidade da vida. Certa vez, minha filha mais nova, Marina, com apenas um ano, precisou de uma radiografia e naquele momento em que a segurei para o raio RX ela me olhou profundamente nos olhos. Havia choro ali mas havia muito mais, havia um claro e silencioso pedido de socorro, pois entendi que para ela, eu era sua única esperança, a ultima salvação. Aqueles olhos nunca mais esqueci e depois de muitos anos a cena se repete, com minha outra filha, kelly já com 26 anos, quando me olhou nos olhos e disse:

- Pai, você vai me deixar? -conforme descrevi no artigo Torrente de Emoções.

Ah os olhos! Sempre fui muito sensível a eles, pois eu penso que sempre consegui ver todas as emoções que parecem jorrar, incontidas, deles. Palavras não são necessárias, eles concentram toda a emoção e neles podemos ver às vezes os danos que causamos a outras pessoas e vice versa. Pois, por uma destas imperfeições da alma humana, aparentemente desenvolvemos o estranho hábito de ter mais facilidade de ferir aqueles que mais amamos. E aí podemos visualizar toda a extensão de nossos danos, mesmo que não intencionais, nos olhos daqueles que amamos e por isto sentimos tanto e sofremos tanto, pois acho que este é um mecanismo da natureza, do criador, de inibir a brutalidade inata do ser humano e  tornar as pessoas mais sensíveis, mais humanas.

Mas sei que nem todos casamentos são como diamantes, eternos. Na verdade, alguns são tão efêmeros como uma chuva de verão e muitos nem deveriam ter acontecido. Mas, em algum momento da vida de cada um, vai se ouvir o chamado da vida (Call of the Life) e em minha opinião melhor responder, pois pode não se ter uma segunda chance, pois nossas vidas não tem segundo ato.

8 comentários:

  1. AMEI! Eu tambem acho que os olhos são o espelho da alma, não temos como esconder o que realmente sentimos. É muito bom saber que você é feliz, e que eu faço parte deste casamento! TE AMO!!!

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  2. Um autor húngaro constrói uma narrativa junto com usuários no Facebook e esta foi uma ideia fascinante ao meu ver. Esta interação ao escrever um texto, um romance enriquece todos nós. Assim deveriam ser os blogs. Nao ha um compromisso com nenhuma linha de pensamento, e voce, sei que sou suspeita, escreve muito bem, em qualquer linha que se aventurar. Tem bagagem para discutir, ouvir... Este texto seu esta perfeito. Todos nós conhecemos casamentos que se enquadram em uma ou outra "versão". Assim como todos, a vida nos chama de várias formas e em vários aspectos. Os sábios ouvem, os demais padecem. É a história da humanidade que nos ensina, mas nem sempre aprendemos. Voce é o sábio da nossa família.

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  3. Se você escrevesse um livro com certeza eu comprava, creio que viraria até Best Seller...

    O casamento é o começo de uma nova vida, é como se a partir daquele momento nascêssemos novamente, e tudo é possível, voltamos a sonhar igual no começo da adolescência, os planos são grandes e muitos....
    Claro, não é fácil dividir a vida ao lado de uma pessoa que você esta começando a realmente conhecer, pois só a convivência 24 hrs permite isto...
    Ainda tenho somente um mês e pouco de casada, mas posso afirmar que há muito tempo não me sentia tão feliz, conto as horas para voltar para minha casinha e voltar a sonhar...sei que como todos os sonhos podemos ter dias de pesadelos, mas se acreditarmos no amor, tudo pode dar certo.
    Certamente é um exercício de paciência e respeito, pois se não houver os dois, o casamento acaba e não porque o amor acabou mas porque as pessoas deixam acabar, realmente o amor tem que ser cuidado todos os dias!!
    Ouço muito de casais casados "Mas não adianta pois tudo que faço não é suficiente"...engraçado, será que não é mesmo? Será que as pessoas realmente tentam? E mesmo se não for o bastante o que custa dedicar um pouco a esta pessoa? Levá-la a um cinema, a um jantar? Quanto tempo as pessoas não gastam por dia com seus hobbies, mas quanto tempo gasta com os seus companheiros? E digo sentar ao lado de alguém e ver uma novela, não é dedicar a esta pessoa, é somente compartilhar um tempo, falar de problemas ou do cotidiano não é conversar com seu parceiro, isto é um desabafo seu e só faz bem para você e não para o outro.
    Quando resolvemos nos casar aquela pessoa e a família que você vai constituir tem que ser mais importante que qualquer coisa ou pessoa, se você sabe que algo vai fazer mal a pessoa amada, não faça!! Doa a quem doer, pois se não, a magoa cresce e só existirá vazio.
    O senso de justiça do amor tem que ser na base do respeito ao seu parceiro e depois aos que te cercam, pois o que acontece é que as pessoas preocupam mais com os outros do que com o sentimento dos seus parceiros e com isto começam as mentiras e então o fim. E é importante dizer que justiça significa ... “como um termo abstracto que designa o respeito pelo direito de terceiros...” ou seja ,respeito pelas pessoas e não somente por você ou pelo o que você acredita ser certo ou errado...
    Toda a nossa felicidade esta em nossas mãos, não existe não deu certo, mas sim eu não quis...
    Não sei se meu casamento vai durar para sempre, mas sei que vou fazer a minha parte e se meu marido fazer a dele tenho somente uma certeza, que seremos sim, felizes para sempre...

    Karen A. Rufino Pitarello

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  4. É a primeira vez que visito seu blog e adorei essa matéria! Me emocionou de verdade, e acho que assim como eu, qualquer pessoa se identifica com alguma destas fases da vida que vc escreveu. Parabéns! Vc escreve MUITÍSSIMO bem!
    Ariane Lopes.

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  5. Rogerio, brilhante! Gostaria que meu casamento tivesse sido como os brilhantes, mas ele foi efêmero, acabou rápido. Mesmo assim foi bom ter acontecido. Sem saber atendi a esse chamado. Acho que todos valem a pena. E aos que ainda resistem e compartilham desta vida, eu diria, que se houver a menor luz, que nao desista e que resista.

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  6. Ha! Em tempo: adorei ter mencionado os tarjas pretas da vida. Vi minha mae definhar aos poucos e dependente destes remédios. Tudo nesta vida deve ser dosado. Há outras formas de se reerguer, não e mesmo?

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  7. Daddy! I´m still looking at you... You are my wonderwall! Love you!

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  8. Ah, os olhos! Eles nos dizem tudo. Revelam os mais profundos sentimentos.
    Casamento é doação.

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