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segunda-feira, 5 de abril de 2010

O primeiro emprego - Série: Os Executivos - Cap. 3

Iniciei minha carreira numa empresa de Telecom em 1986, e as empresas brasileiras viviam numa fase imediata ao Big Bang, pois no principio era a treva. Vocês nem queiram imaginar o país naquela época, povoada de empresas estatais: acho que a sensação seria similar a que senti quando retornei de minha primeira viagem aos EUA em 91, e avistei do alto ainda, estacionado na pista do aeroporto do Galeão, uma Brasília velha, orgulho da industria automobilística nacional na época.

Claro nas trevas estatais, não havia ainda terceirização de atividades não fins, e os altos executivos Telecom se reunião para discutir, por exemplo, os problemas de suas equipes de manutenção em aparelhos de ar condicionado.

Naquela época eu evidentemente não era ainda um executivo perigoso, era apenas o perigoso. E lá fui eu trabalhar nos subterrâneos da empresa, numa área, chamada carinhosamente pelos colarinhos brancos dos andares superiores de submundo.

A empresa tinha administração ainda familiar, mas o presidente, uma pessoa boníssima e iluminada resolveu trazer um executivo estrangeiro para modernizar a empresa. Claro a primeira coisa que ele fez foi terceirizar as atividades não fins. Pois bem, eu, o perigoso, estava no submundo numa atividade não fim, e 1.200 colegas meu de trabalho foram dispensados em 1 ano.

As cenas que se viam então eram dramáticas. Primeiro era enviado um executivo Avatar, chefe do RH, mais conhecido na organização como Gestapo. Ele entrava serpenteando entre a turba assustada e ia distribuindo sorrisos plastificados e tapinhas nas costas de alguns, sinal que estavam condenados. Logo depois vinha a milícia, com seus cães farejadores, formados em psicologia. Eles entravam marchando e iam apontando para a turba, aquele ali, o outro lá, peguem nos. Alguns funcionários se desesperavam, a maioria corria sem rumo, outros tentavam o suicídio saltando da janela, mas como estavam no subterrâneo, o máximo que conseguiam era uma galo na cabeça.

Lá fora, o sindicato (naquela época existia isso meninos), uns magricelas vestidos de Che Guevara, cantavam canções de guerra: Companheiros unidos, jamais serão vencidos.

Enquanto os Guevaras gritavam e faziam barulho com seus bumbos, os caminhões caçamba, nos quais eram jogados os funcionários (companheiros), iam despejando os infelizes na rua, que realmente não eram vencidos pois nem reação tinham, tudo sem luta.

Tão logo caiam, psicólogas do RH iam atirando suas carteiras de trabalho, acompanhadas de bilhetinhos desejando sucesso em suas novas atividades.

Estas cenas se repetem hoje em dia, de maneira muito mais sofisticada, nas organizações, geralmente no final de cada ano, e são conhecidas popularmente como o Facão. Na verdade elas não precisam existir, mas os patrões gostam das tradições e procuram perpetuá-las.



Alguns conseguiam se safar: uma colega minha se acorrentou a sua mesa, e tão logo foi lacrado o submundo, alguém dos andares superiores, requisitou uma mesa, e lá acorrentada a ela, veio o último baluarte do segundo escalão, preservado na empresa até hoje, pela sua garra, competência e pelas suas sete vidas.

Eu não fiquei parado: o Grande Guimarães Rosa, já dizia: “ Sapo não pula por boniteza mas porém por precisão”. Esta é a primeira lição que vocês devem guardar.

Antes que o Avatar me pegasse, eu busquei algo novo, e o que diferencia as pessoas é basicamente sua capacidade de enxergar oportunidades nos lugares que mais improváveis.

Segunda lição.
Encontrei uma oportunidade no andar superior, identificar o problema em um equipamento de uma indústria do grupo que tinha um sócio estrangeiro. Pois bem, analisei e fiz meu relatório no qual apontava que haviam 72 componentes no equipamento que não estavam ligados a nada, sem serventia, só gerando custos. Claro, a bomba explodiu dentro e além mar, provocando choro e ranger de dentes nos quatro cantos da organização.

Minha salvação foi que o relatório era preciso e claro, embora avatares circulassem constantemente ao meu redor, mas escapei desta e fiquei conhecido como o sobrevivente.

Mas, o maior risco de qualquer perigoso, é seu ego, o seu desejo incontrolável de divulgar a descoberta, e assim despachei o relatório bomba para o alto escalão e até mesmo para o presidente, não esquecendo de copiar meu chefe, que ficou petrificado ao saber do dito cujo, sendo necessário um guincho para removê-lo se sua mesa. Portanto meninos, cuidado com seus ímpetos iniciais, e esta é a terceira e ultima lição de hoje.

O curioso é que se você tem algo valioso em suas mãos, e você segue a cartilha, respeitando os degraus da hierarquia, possivelmente algum executivo do tipo Mauricinho, vai enterrar o seu tesouro, e você pode lavar anos para sair do anonimato, ou talvez nunca saia.

Então é preciso avaliar muito bem a situação, pois cedo ou tarde você terá que arriscar. De preferência, mais cedo do que tarde, pois se demorar muito, vem a aposentaria, a gota e outras coisas do gênero.

4 comentários:

  1. Aguardamos ansiosamente pelos próximos capítulos, nos quais poderemos apreciar os "próximos capítulos", certo? Aliás, consegui aprender várias palavras novas, que serão incorporadas ao meu vocabulário, tais como píncaros... O humor ácido, perspicaz e sarcástico do blog é contagiante. Muito bom! Parabéns, sogrão!!! Um abraço e dez pontos para a minha puxada de saco!!

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  2. Otávio, muito obrigado. Espero que no meio de todas esta bricadeira (séria) eu possa transmitir, nas entrelinhas, um pouco de minha experiência para vcs que estão começando como executivos. Este blog é dedicado aos jovens, pois a velha guarda já sabe de tudo isto, só não adimitem, pois podem perder o prêmio de reusultados e outras benesses. Abraços

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  3. Daddy!!!! You are my hero!! The best of all! Sabe quando as crianças ficam ansiosas por novos gibis, e quando ganham, é como se o mundo parasse, pois só aquela historinha ali escrita importasse? Pois é, eu que nunca gostei de ler, me sinto exatamente dessa forma! Qual será o próximo capítulo?! LOVE YOU!

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  4. Love you too my little honey. Você, apesar de tão jovem consegue me dar toques em seus emails, quando ultrapasso os limites. Mas o humor é assim mesmo, ele é corrosivo por natureza, então há os que odeiam, provavelmente a maioria dos leitores, e os que amam, geralmente o leitor (autor lendo seus textos). Beijos

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