Certa vez, já morando na América, recebi uma missão de acompanhar dois executivos coreanos para uma série de visitas a empresas de alta tecnologia no Canadá e Estados Unidos, buscando parcerias estratégicas de negócios ou o que quer que seja isto.
Well, coisa simples pensei: voei de Washington para New York no final da tarde e tive uma reunião rápida com os Koreans. Partimos na manhã seguinte para Quebec, se não me engano, ou Montreal, bem não faz muita diferença, o Canada no inverno é tudo igual: Paisagens brancas, misturadas a tons cinzas claros e escuros. Explico, você quando anda nas ruas ali, vê uma imensidão branca, a neve cobrindo tudo, com o asfalto escuro das avenidas e ruas serpenteando entre aquela paisagem polar.
Caminhões limpa-neve (snowplow), com lâminas acopladas na frente, removem toda a neve para que os carros possam transitar, e aí a fumaça dos automóveis vai tingindo de preto as bordas das ruas e avenidas, deixando tudo com aspecto de sujeira. Para completar, árvores completamente desfolhadas contemplam um céu cinza que parece tocar os tetos dos carros. Além do frio glacial, este é um dos motivos pelos quais os canadenses vivem praticamente nos subterrâneos das cidades.
A reunião foi normal, sem interrupções, com um business lunch, correndo em paralelo. À medida que um ou outro tinham uma pausa, pegavam um cold lamb sandwich e comiam o mais rapidamente possível.
O executivo chefe Coreano era um ator, e possuía lá seus cacoetes: quando ele ia falar, ele cruzava as mãos logo abaixo do queixo e começava suave e pausadamente, sempre assim: Anyway, ...
Anyway é similar ao Veja Bem, utilizado pela maioria dos executivos tupiniquins, quando não sabem uma resposta.
Presidente: - Mas Sr. CEO, por que nossa empresa está no vermelho?
CEO: - Veja bem Sr. Presidente, o dólar subiu e prejudicou nossas vendas (ou o dólar caiu e prejudicou nossas vendas).
É sempre ele, o Dólar, e claro, tem uma porção de outros clichês muito utilizados, mas esta é outra história. A verdade, é que eles servem apenas para escamotear uma má administração. Existem até livrinhos de auto-ajuda para executivos, com os mais requintados clichês para se usar nas reuniões do conselho de administração.
Para que vocês compreendam, universo dos Executivos, é preciso entender que eles possuem poses características, cada qual representando o nível de importância de cada um.
Por exemplo, um executivo iniciante jamais levanta as mãos acima da mesa, no máximo, segura uma canetinha ou apóia uma mão sobre a outra na mesa.
Um executivo mais graduado, como nosso amigo coreano, já cruza as mãos pouco abaixo do rosto.
Um super graduado apóia o queixo na palma da mão e levanta dois dedos, recostados à sua bochecha, na direção de seu olho.
Jamais vocês verão um executivo cruzar os braços como um jogador de futebol numa fotografia de final de campeonato. Isto é coisa de técnico.
Se o cara fica digitando em um notebook o tempo todo, ou ele é secretário, especialista em informática, ou trabalha na qualidade (digitam o tempo todo, pois imagino que tem o que se chama de correntes de idéias- stream of ideas,), coisa que muito surpreendeu o Albert Einstein, em sua visita ao Brasil. Nela, seu host brasileiro, de tempos em tempos, tirava um caderninho do bolso e fazia uma anotação. Einstein perguntou o que era aquilo, e o profícuo host explicou a ele que toda vez que ele tinha uma idéia nova, ele anotava. O host então perguntou ao Einstein se ele não fazia o mesmo. Ele respondeu que não, pois até aquele momento ele tinha tido uma única idéia na sua vida.
Lá pelas 3 da tarde, finda a reunião, corremos para o aeroporto para pegar um vôo das 5 horas. Chegando ao aeroporto, me deparo com uma alfândega (customs). Pensei, mas que diabos estes canadenses querem, nunca vi imigração pedir visto para um cara sair do país. O funcionário me pediu o passaporte e me perguntou o que eu ia fazer nos Estados Unidos. Respondi que ia me encontrar com Mr. Clinton, e que isto não era da conta dele. Claro, o rapaz ficou vermelho, e como não existia ainda o Bin Laden, ele deve ter pensado que eu era Carlos, o Chacal e me conduziu para uma sala, onde só então eu percebi que aquilo era a imigração americana, um posto avançado dentro dos aeroportos canadenses. Tive que usar de toda minha astúcia com a funcionária americana para poder me safar e pegar o vôo a tempo. A funcionária, no final da astúcia, fez a gentileza de mandar o comandante de vôo me aguardar, e naquele dia, fui o responsável, por atrasar um vôo comercial internacional, mais uma façanha deste nobre executivo que vos escreve.
Chegando á porta do avião, lá estava o Mr. Anyway me esperando, desta vez com outra pose, a de Bruce Lee.
À noite estávamos em Detroit, na manhã seguinte, em Los Angeles. Reunião pela manhã, mais poses nossas e de Mr. Anyway. Estávamos ficando especialistas nelas, já tínhamos até coreografias quase ensaiadas. À tarde voamos par Houston para mais poses, quer dizer mais reuniões. À noite chegamos de volta a New York, nos sentindo Master of the Universe, dois países e 5 cidades, coast to coast, em 2 dias.
Retornei a Washington de trem, pois já não agüentava mais ver avião. O trenzinho New York to Washington, até que é legal, não é tão rápido como os europeus e japoneses, leva umas 3 horas, chega a uns 160 km/h e é muito confortável. E o melhor de tudo, não tem nenhum executivo coreano nele.
To Be Continued